O livro
impresso foi a chave tecnológica do desenvolvimento da educação
sob os Song. Como comenta Tsien Tsuen – hsuin em sua obra magistral
sobre o papel e a imprensa, foi o papel o primeiro elemento a
explicar o sucesso dos chineses na invenção do livro impresso.
Embora seu desenvolvimento date do segundo ou do primeiro século
a.C., ele só foi usado na impressão com clichês no final do
período Tang. Os Song do Norte foram a primeira sociedade a contar
com livros impressos.
A Europa
estava muito atrás. O papel era mais barato quando feito de fibras
vegetais, como na China, do que quando feito de trapos, como na
Europa, da mesma forma que a impressão com clichês de madeira era
mais simples, mais barata e convinha melhor aos ideogramas chineses
do que os tipos móveis. A matéria impressa foi a força vital da
expansão da elite Song.
Os
livros impressos deram grande impulso à educação, tanto nos
monastérios budistas quanto no seio das famílias. Inicialmente, o
governo tentou manter controle absoluto da impressão, que era muito
difundida. Mas por volta de 1020, ao contrário, ele passou a
encorajar a fundação de escolas, por meio de doações de terras,
mas também de livros.
O
objetivo era que cada prefeitura tivesse uma escola do governo. As
escolas recrutavam os candidatos, conduziam os rituais confucianos e
davam conferências. John W. Chaffee (1985) conta que, por volta de
1.100, o sistema escolar do Estado possuía 1,5 milhão de acres de
terra e podia manter cerca de duzentos mil estudantes.
O
sistema de exames tornou-se uma enorme e intrincada instituição,
central para a vida das classes superiores. Durante cerca de mil
anos, dos Tang até 1905, ele exerceu papéis variados em relação
ao pensamento, à sociedade, à administração e à política.
Os dois
primeiros imperadores Song construíram o sistema de exames com
objetivo de recrutar pessoal para sua burocracia. O privilégio yin,
pelo qual os funcionários superiores podiam indicar seus filhos como
candidatos por nomeação ainda vigorava, fazendo com que a classe
dos funcionários se autoperpetuasse parcialmente. Mas enquanto as
dinastias de meados do período Tang recrutavam 15% de seus
funcionários por meio dos exames, os Song passaram a obter cerca de
30% a partir deles. Os examinadores Song tentaram selecionar homens
capazes de defender a nova ordem civil “leais à ideia de um
governo civil”, diz Peter Bol (1992). Ao tomar precauções contra
a cola, os examinadores tinham de usar certos dispositivos, como
revistar os candidatos na entrada, numerar as provas em vez de
colocar nomes e copiar os trabalhos para evitar que os corretores
reconhecessem a caligrafia do redator. Em 989, foram estabelecidas
cotas de candidatos a serem aprovados em cada exame, de maneira que
certas regiões geográficas onde o nível de conhecimento acadêmico
era alto não tivessem vencedores demais no concurso.
Pesquisas
pioneiras feitas há algumas décadas concluíram que os exames da
dinastia Song ofereciam uma oportunidade de carreira às pessoas
talentosas, permitindo que jovens adultos ingressassem no
funcionalismo por seus próprios méritos. Mas uma análise recente
mais atenta sugere que as grandes famílias continuavam, de toda
maneira, a fazer com que seus candidatos entrassem no serviço
público em número muito maior, parte em virtude de uma formação
doméstica superior, parte pelo jogo de influências, por
recomendações e contatos. Chaffee descobriu que, durante os três
séculos dos Song, os exames tornaram-se cada vez menos importantes
para a obtenção de um cargo e, apesar isso, de modo paradoxal, cada
vez mais homens se apresentavam para os exames. Isso reflete o fato
de que as famílias de funcionários da classe dominante encontravam
cada vez mais maneiras especiais para que seus filhos obtivessem
diplomas – por exemplo, por meio do privilégio yin de
recomendação, ou pela prestação de vários exames especiais ou
restritos, fora da competição regular e – coisa ainda mais
surpreendente – pelo simples fato de se submeterem sucessivamente
aos exames e serem sempre reprovados! (o que lembra as cadernetas
concedidas às crianças retardadas, que obtêm pelo menos uma nota
“A pelo esforço”). Disso resultava que os detentores de diplomas
normais constituíam 57% do serviço civil em 1046; em 1149, eles
perfaziam 45; em 1191, 31%; e 27% em 1213. Essa taxa descrente de
sucesso se mostrava na proporção entre aprovados e reprovados
baixada por lei (isto é, por decreto), à medida que o número de
candidatos crescia: em 1023, podiam passar cinco em cada dez
candidatos; em 1045, dois em cada dez; em 1093, um em cada dez; em
1156, um em cada cem e, em 1275, um em cada duzentos. Quanto mais
candidatos entravam em competição, menor o número dos que
passavam.
Assim,
ter uma educação clássica e submeter-se aos exames tornou-se uma
certificação de status social, quer o candidato passasse ou
não, que ele obtivesse ou não um cargo de funcionário. Um estudo
exemplar dessa comunidade feito por Robert Himes (1986) retraça a
maneira pela qual o crescimento da classe de eruditos ultrapassou de
longe o aumento de cargos do Estado, impossibilitando a maior parte
dos diplomados por meio dos exames de ingressar na elite profissional
do funcionalismo civil. Entre duzentos mil estudantes escritos, a
metade se candidatava a um exame em que tinham de competir por
quinhentos diplomas que lhes permitiam a entrada no serviço civil de
cerca de vinte mil funcionários. Assim, a maioria dos estudantes via
o caminho para os cargos públicos bloqueado. Em tal situação, o
crescimento de comunidades rurais de mercado, com a necessidade de
líderes locais, fez com que os eruditos se sentissem de novo
atraídos a regressar a suas aldeias natais. Na dinastia Song, o
status de uma família de elite começou a depender menos de
que um membro da família ocupasse um cargo de funcionário e mais da
riqueza, do poder e do prestígio familiar no cenário local.
Himes
descobriu que as 73 famílias da comunidade de elite que ele estudou
mantinham seu status de elite, em média, por 140 anos. Ele
identificou ainda “densas redes de conexões” - familiares,
acadêmicas e pessoais – unindo funcionários e pessoas do povo.
Ocupar um cargo no serviço civil tornara-se apenas um fator –
sequer um fator indispensável – para estabelecer um status
de elite. Em outras palavras, a elite tinha se estendido de forma a
englobar magnatas locais, chefes de família e servidores públicos
informais, assim como ex-funcionários. Todos eles deviam, no
entanto, dispor, como pré-requisito, de uma educação clássica,
que os qualificava como membro da classe dos shi – eruditos
ou “cavalheiros”. Por intermédio de sua formação confuciana,
tais homens desenvolviam um senso de responsabilidade de forma a
manter o mundo material e moralmente em ordem. Eles eram guiados pelo
credo do neoconfucionismo, uma filosofia de vida que se originou nos
debates dos funcionários eruditos sob os Song do Norte.
Fonte:
China – Uma Nova História, páginas 100 a 102.
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