Irapuan Costa Junior
Carlos Lamarca: o capitão do Exército desertou e, aliado a esquerdistas, contribuiu para matar pessoas inocentes.
Resultado: foi valorizado pelos governos da esquerda
Foto: Wikipédia
Verdades sobre a dita Comissão Nacional da Verdade: todas as “verdades” que a Comissão Nacional da Verdade vem de proclamar por meio de seu relatório publicado no presente mês, já eram esperadas, desde o dia em que se instalava com pompa a dita cuja, mais de dois anos atrás. Não há surpresas. São “verdades” sabidas — e contestadas — antes mesmo de seu levantamento (melhor seria dizer de seu “preparo”) e sua publicação. O relatório é um ovo de réptil, jamais um ovo de pássaro. As afirmações dele constantes, feitas de encomenda para inculpar os militares e desculpar os terroristas, não podem ser tomadas como verdades, pura e simplesmente. Quando muito serão meias verdades, e o que há de positivo nelas — como a condenação das torturas e da subtração às famílias de desaparecidos do direito de sepultar seus mortos — perde muito do valor, pela omissão dos crimes do terrorismo, que a comissão escondeu. Se as “verdades” do relatório não podem ser tomadas inteiramente como tal, as verdades abaixo enunciadas não poderão ser contestadas. Se alguém provar que alguma delas merece desmentido, caro leitor, vou me penitenciar.
Verdade 1
Embora criada pela Lei 12.528, de 18 de novembro de 2011, que, conforme seu artigo 6º, exige o respeito à Lei de Anistia, a dita Comissão Nacional da Verdade, em seu relatório, propõe que se ignore essa anistia, mas apenas para os agentes do Estado (vale dizer, para os militares), mantendo integralmente seus benefícios para os terroristas.
Mesmo que a validade da Lei de Anistia tenha sido até reafirmada pelo Supremo Tribunal Federal (em abril de 2010), ainda que a anistia seja hoje além de benefício legal (Lei 6.683, de 28 de agosto de 1979) e também tenha sido incorporada à Constituição pela Emenda Constitucional nº 26, de 27 de novembro de 1985, o relatório da dita Comissão da Verdade nega todo esse aparato legal, já na segunda recomendação das 29 que faz:
“[2] Determinação, pelos órgãos competentes, da responsabilidade jurídica — criminal, civil e administrativa — dos agentes públicos que deram causa às graves violações de direitos humanos ocorridas no período investigado pela CNV, afastando-se em relação a esses agentes, a aplicação dos dispositivos concessivos de anistia inscritos nos artigos da Lei 6.683, de 28 de agosto de 1979, e em outras disposições constitucionais e legais.”
Verdade 2
Nenhum dos componentes da dita Comissão Nacional da Verdade é figura de respeito geral da nação por serviços prestados ou por elevadas qualidades culturais ou morais; têm como característica a identidade com o pensamento de esquerda. Isso não os deixa isentos para um exame de conflitos (armados, principalmente) entre esquerdistas e militares, durante os anos de vigência do regime militar.
Não há entre os membros da dita Comissão, por exemplo, um ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, ou um membro das Academias Brasileiras de Letras ou de Ciências. Não está ali presente nenhum historiador de renome. São apenas figuras apagadas da burocracia, do academicismo ou da política menor. Falta-lhes pois, além do conhecimento, a grandeza, que em geral vem acompanhada da visão mais larga, da seriedade e da isenção que a tarefa exigia.
Ernesto Geisel: o general, que matou a ditadura, impediu a tortura e mais mortes no II Exército, em São Paulo: Resulado: foi execrado pela Comissão Nacional da Verdade
Verdade 3
Mesmo acionada por terceiros inocentemente envolvidos nos fatos que deveria apurar, a dita Comissão da Verdade evitou que fossem responsabilizados terroristas vivos ou mortos, mesmo diante de claras evidências de violação de direitos humanos.
Citemos um exemplo — apenas um, de muitos — dos fatos graves de violação desses direitos promovidos por terroristas e ignorados deliberadamente pela CNV, como foi relatado por Cardênio Jaime Filho: em 2 de setembro de 1971, um comando terrorista assaltou a Casa de Saúde Dr. Eiras, em Botafogo, no Rio de Janeiro, para roubar o dinheiro do pagamento dos funcionários. Os terroristas buscavam fundos para a luta armada, que suas organizações articularam a mando de Cuba, cujo regime sonhavam importar para o Brasil. Chegaram atirando, e mataram no ato três vigilantes, entre eles o pai de Cardênio. Só nessa operação, a luta armada deixou 22 órfãos, de famílias pobres, que jamais tiveram, como têm muitos terroristas ou seus familiares, dinheiro das “bolsas ditadura” distribuídas com prodigalidade pelos governos de esquerda. Cardênio procurou recentemente, segundo relatou ao jornal “O Globo”, a dita Comissão Nacional da Verdade, buscando uma tardia reparação, ainda que fosse apenas moral, para a família. Ouviu que a Comissão não tomaria conhecimento do assassinato de seu pai, pois só cuidava de casos em que militares e policiais eram culpados. Os terroristas já haviam sido julgados e condenados. Mas Cardênio tinha o nome de todos (eram 11), que nunca haviam sido incomodados. Dois ainda eram vivos, e um tinha até uma sinecura na Câmara dos Deputados. Nem assim foi ouvido. Mandaram-no catar coquinhos, ou lamber sabão, ou ainda pentear macacos, sei lá. “Grande” Comissão Nacional da Verdade.
Vale lembrar que até o diretor da ONG Human Rights Watch, o chileno José Miguel Vivanco, alguém que jamais poderá ser chamado de direitista ou simpatizante de militares, disse à “Folha de S. Paulo”, no dia 14 deste mês, que a Comissão Nacional de Verdade erra, e adota dois pesos e duas medidas, ao investigar os militares e esconder os terroristas, no apurar abusos aos direitos humanos.
Verdade 4
O relatório da dita Comissão Nacional da Verdade menciona detalhadamente 434 mortes e desaparecimentos que considera promovidos por agentes do Estado, quase todos entre as organizações de esquerda que inauguraram a luta armada. Mesmo os que morreram fora do Brasil ou que se suicidaram, como os que morreram em combate, com armas na mão, têm suas mortes debitadas aos agentes do Estado, o que para a CNV significa os militares. Até em homicídios praticados por pistoleiros, em conflitos de terras, a dita Comissão Nacional da Verdade vê responsabilidade dos militares. Há no relatório uma descrição detalhada da vida de cada um desses militantes. Nem um dos cerca de 120 mortos pelas esquerdas, na maioria inocentes, apolíticos, sem credo ideológico, foi sequer mencionado. Os mortos pela esquerda brava não mereceram indenizações ou apoio. Suas famílias foram ignoradas. Nem sequer tiveram uma menção ou memória da dita Comissão Nacional de Verdade. Não sendo de esquerda, nada do que lhes foi feito, por mais cruel que tenha sido, foi classificado como “grave violação dos direitos humanos”. São brasileiros de segunda classe, e nem merecem lágrimas, para os membros da dita Comissão Nacional da Verdade.
Verdade 5
Ao citar o presidente Ernesto Geisel, no relatório, como “responsável político-institucional” por violações de direitos humanos, a dita Comissão Nacional da Verdade apenas mostra sua ojeriza aos militares. Mesmo militantes de esquerda mais equilibrados, inteligentes e isentos, veem em Geisel o presidente que em primeiro lugar eliminou a tortura dos porões do regime, e em segundo lugar promoveu a volta à democracia plena. Geisel teve a coragem de enfrentar a parte mais extremada de seus colegas de farda, e demitir o comandante do II Exército, Ednardo D’Ávila Mello, quando constatou a prática de tortura, contrariando suas determinações, nas dependências de unidade sob seu comando. Foi ele também quem demitiu o ministro do Exército, Sylvio Frota, que se insurgia contra a abertura e dava cobertura aos “duros” do regime, únicos que poderiam ter responsabilidade em excessos no combate ao terrorismo, dentro dos quartéis.
As vítimas das vítimas
26 Dez 2014
Jaime Edmundo Dolce
Quando ouço falar em revisão da Lei da Anistia, fico enojado. Se ela for revista, minha mãe terá a chance de ver julgados os assassinos de meu pai?
A divulgação do relatório final da Comissão Nacional da Verdade veio à tona no último dia 10 comovendo muitas pessoas, inclusive a presidente da República, Dilma Rousseff. Para minha família e eu, no entanto, a emoção se transformou em um misto de revolta e indignação. Esse documento não dedica um capítulo sequer às pessoas que, como meu pai, foram brutalmente assassinadas por terroristas de esquerda.
Meu pai, Cardênio Jayme Dolce, nasceu em Dom Pedrito (RS), em 1914. Ainda pequeno, mudou-se para Porto Alegre onde fez o Colégio Militar. Na década de 1930, foi morar no Rio de Janeiro, onde serviu na Escola Naval. Saiu da Marinha como aspirante porque não queria prosseguir na carreira militar, seu desejo era ser policial civil.
Foi da Polícia Civil até 1968, quando se aposentou como agente federal de primeira classe, cargo que hoje equivale ao de um delegado da polícia civil. Em 1969, começou a trabalhar como chefe de segurança da Casa de Saúde Dr. Eiras, instituição privada que atendia doentes mentais em Botafogo, no Rio.
Lá trabalhou até 2 de setembro de 1971, quando foi cruel e covardemente morto a tiros de metralhadora disparados por terroristas da ALN (Aliança Libertadora Nacional).
Na época eu tinha 10 anos e meus irmãos, 13, 12 e 8. O grupo terrorista invadiu a clínica onde ele trabalhava para roubar cerca de 100 mil cruzeiros, que seriam pagos aos funcionários. Para realizar o assalto, mataram meu pai e outros dois colegas, Silvino Amancio dos Santos e Demerval Ferreira. O enfermeiro Almir Rodrigues de Morais e o médico foram feridos.
Meus irmãos e eu nos tornamos quatro das 21 crianças que ficaram órfãs de pai depois da chacina promovida pelos terroristas da ALN.
Pouco tempo depois do atentado, soubemos pela televisão que havia sido feito um ataque terrorista à Casa de Saúde Dr. Eiras e que meu pai e outros colegas tinham sido baleados. Ou seja, fomos os últimos a saber do atentado.
Depois de 2 de setembro de 1971, nossa rotina se transformou completamente. Meu pai deixou algum patrimônio e uma boa pensão da polícia, mas, apesar disso, minha mãe teve que se desdobrar para sustentar meus três irmãos e eu.
Hoje, aos 79 anos, mamãe continua esperando um pedido de desculpas do Estado.
Minha família nunca entrou na Justiça, pois sabíamos que eram pequenas as chances de haver algum reparo. O dono da Casa de Saúde Dr. Eiras era Leonel Miranda, que tinha sido ministro da Saúde no governo do general Artur da Costa e Silva (1967-1969). Ele prometeu dar amparo às famílias das vítimas.
No final das contas, não fomos amparados por ninguém, nem pela Casa de Saúde Dr. Eiras nem pelo governo militar. Minha família recebeu apenas os direitos trabalhistas do meu pai. Só isso.
Dos terroristas que assassinaram meu pai, dois estão vivos: Sônia Hipólito, servidora da Câmara dos Deputados, e Flávio Augusto Neves Leão Salles, que vive hoje no Pará.
Minha família, apesar de todo o estrago que foi feito, hoje vive em paz. Eu espero apenas que não se faça a revisão da Lei da Anistia, como querem aqueles que defendem os terroristas de esquerda.
Meu pai não era agente da ditadura, não torturou ninguém, não caçou comunistas. Teve o azar de estar no lugar errado, na hora errada. Quando ouço alguém falar em revisão da Lei da Anistia, fico enojado. Se a lei for revista, minha mãe, aos 79 anos, terá a chance de ver julgados os assassinos de meu pai?
Jaime Edmundo Dolce, 53, é comerciante em Varginha (MG)
OS FILHOTES DA “ABERTURA”
Ob in Freude, ob in Not, Bleiben wir getreu bis in den Tod (seja na alegria, seja no pesar, seremos fiéis até a morte) – de "Alte Kameraden" (Velhos Camaradas), marcha de Carl Teike, composta na Prússia em 1889, que costuma ser executada nas Academias Militares do mundo inteiro, especialmente ao fim do curso.
A guerrilha organizada em todo o sub-continente Sul-americano por inimigos do Estado nacional tumultuou o Brasil em dada época, provocando mortes de civis e militares e prejuízos materiais. Contra ela o Exército Brasileiro e as demais Armas se mobilizaram. E um regime de exceção se impôs por necessário, para que a população pudesse prosseguir vivendo sem experimentar os horrores de uma guerra civil. Confundindo novos métodos de ação adotados pela dita “esquerda” com a pacificação do País, os militares se recolheram aos Quartéis e, antes de entregar o poder novamente aos civis, permitiram uma anistia generalizada e o retorno ao território nacional dos que se auto-exilaram no exterior ao perderem seus cargos e/ou direitos políticos por terem cometido ações terroristas ou por terem fomentado uma agitação irresponsável.
A guerrilha, porém, passou a contar com farta literatura fantasiosa e romantizada a justificá-la, o que deixou latentes suas alegadas razões ainda que não se ponha em ação. Sensibilizando os incautos, os “ex-guerrilheiros” puderam ser eleitos pelo voto direto, fazendo do Estado brasileiro o que bem entenderam sem que suas atitudes e suas intenções, tanto as do passado quanto as voltadas ao futuro, fossem questionadas – enquanto o porquê da anterior intervenção militar pôde ser sistematicamente omitido de nossa História, e vem sendo, no presente, pervertido por alguns e absolutamente esquecido por outros.
Alguns brasileiros, não muitos, indignaram-se com a invenção de uma Comissão de notáveis reunida às expensas do próprio Estado cujos “trabalhos” se destinavam a engordar essa literatura, divulgando uma “verdade” que condenasse a repressão aos “ex-guerrilheiros” e “ex-terroristas” como tendo sido criminosa. Alguns brasileiros, poucos, indignaram-se com o resultado dessa pantomima armada, que proclamou como “torturadores” 377 militares de várias patentes, entre eles os Presidentes da República e o Patrono de uma das três Armas do Estado. Alguns brasileiros, bem mais poucos, uns três ou quatro, acreditando que a Comissão “cumpriu seu papel”, indignaram-se apenas com a inclusão de seus familiares ou algum antigo conhecido que fosse considerado uma boa alma naquela lista. É o caso de Dona Claudia Maria Madureira de Pinho, que acusa uma injusta menção ao nome de seu pai entre os que teriam sido responsáveis por “crimes contra a humanidade” por lhe ter sido atribuído o combate aos “revolucionários”. Trocando em miúdos, o que lhe ocorreu levantar contra a leviandade daquela Comissão (seria apenas “leviandade” ou essa Comissão teria um claro propósito?) pode ser resumido em um único parágrafo:
“Eu, que sou sua filha, vou contar quem foi papai – o que ninguém mais poderá fazer. Posso afirmar que papai, que nasceu pobre, de mãe analfabeta, e só matou um único alemão na Batalha de Montese, não cometeria crimes contra a humanidade, pois só entrou nas Forças Armadas porque achou que poderia ter futuro. Talvez papai não devesse ter acreditado no Exército. Papai foi preso e arriscou uma corte marcial por se recusar a separar os soldados brancos dos negros em seu pelotão durante paradas. Um preso político, que almoçava com papai na Vila Militar, ao ser libertado foi visitá-lo. O período da ditadura foi difícil para papai e para mim porque, quando papai implorava que eu ficasse em casa porque tinha medo de que eu desaparecesse e ele não conseguisse me localizar, eu o desobedecia e ia engrossar as passeatas contra o Governo. Entre os melhores amigos de papai estavam vários militares cassados pela ditadura. Mas quando Geisel e Frota quiseram acabar com o horror dos porões, depois de Vladimir Herzog ter sido assassinado dentro de sua cela no DOI-Codi, chamaram papai para comandar o Centro de Informações do Exército. Papai viajou de quartel em quartel tentando impedir a barbárie praticada por quem não era militar de fato e por ordens não podia ser contido. Então, papai, que mantinha um pedido de saída para a reserva pronto na gaveta, explicou a Geisel e a Frota que não tinha perfil adequado ao cargo porque sua vida no Exército Brasileiro, que abrigou alguns dos homens mais abjetos em suas fileiras, havia sido toda baseada no respeito à Convenção de Genebra.”
Como é que é?
Bem, festa é festa. Essa festa não é nossa, e nela sempre caberá mais um, desde que dance conforme a música. Mas, se, definitivamente, essa festa não é nossa, a quem de nós esse samba do crioulo doido deveria comover? E por que os atos e as decisões estritamente individuais de alguém que tenha sido nomeado “torturador” por meia dúzia de trapaceiros deveriam nos interessar em especial? O General Antonio da Silva Campos, se alcançou o posto que ostentava, idiota não seria e algum espírito de caserna deveria ter demonstrado e ter mantido, mesmo após ter passado para a Reserva. Sentir-se-ia hoje gratificado por essa “defesa” pública feita por sua filha? Por quê? Porque teria sido ele o único injustiçado entre seus camaradas ao ser proclamada a “verdade” da tal Comissão? Que verdade essa Comissão proclamou, afinal? Há alguma verdade a respeito de alguém no documento por ela divulgado? Ou haveria, por acaso, muitas verdades a respeito de muitos e mentiras apenas a respeito de outros poucos incompreensivelmente contemplados?
Muitos brasileiros se admiram ao tomar conhecimento das “contradições” dos que hoje estão no Governo fazendo uso do poder que lhes foi delegado para locupletar-se particularmente da forma como bem entendem. Todos nós nos esquecemos de observar, no entanto, as “contradições” dos que os combatem ou dizem combatê-los. Não percebemos a que ponto de desrespeito por nossa própria História nós chegamos, a que ponto alcançam a nossa absoluta falta de consciência e a nossa tolerância com a miséria moral ao fim de tantos anos sob o jugo da dita “esquerda”.
Mesmo os que viveram as tensões e as angústias nos Quartéis e no seio das famílias de Oficiais militares no período pré e pós 1964 podem compreender perfeitamente que os mais jovens tenham uma impressão equivocada do que ocorreu no passado e do que hoje ocorre – e sabem que é impossível competir com a propaganda dessa dita “esquerda”, especialmente quando se vêem aparelhadas tal como estão a Imprensa, a Educação, a Cultura em geral. Será igualmente impossível, porém, aceitar que os filhotes da chamada “abertura” não tenham uma idade determinada e que qualquer criaturinha que seja filha de um General que tenha ocupado uma função de tamanha responsabilidade durante o regime de exceção venha publicamente dizer o que nos disse Dona Cláudia.
Se ela não consegue bem compreender o que moveu seu pai em vida ou considera o que ele tenha feito insuficiente para de sua memória se orgulhar, que não invente histórias da carochinha tentando desculpá-lo do que ela mesma acredita ter sido errado ou do que ela mesma sinta vergonha sabe-se lá por quê; e tente, sim, resolver-se com a ajuda de um psicanalista. Mas que não envolva alguém mais em seus dramas pessoais. Que vá insultar o Exército Brasileiro e os nossos Soldados assim no quinto dos infernos! E que no quinto dos infernos vá também pastar quem considere muito nobre essa demonstração de “amor filial” e demais atitudes semelhantes.
VaniaLCintra
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Texto que vem sendo divulgado por correio eletrônico e talvez tenha sido publicado em algum lugar que não é citado:
Pela memória de meu pai
Papai não cometeu crimes contra a humanidade. Tentou evitá-los. Foi escolhido para o cargo para isso. Por seu perfil. Era a missão. Acreditava na instituição do Exército
Pouco após o assassinato de Vladimir Herzog dentro de sua cela no DOI-Codi, em São Paulo, o presidente Ernesto Geisel e o ministro do Exército, Sílvio Frota, convocaram meu pai ao Planalto. Desejavam que assumisse o comando do Centro de Informações do Exército, o Ciex. Precisavam de alguém que acabasse com o horror dos porões. Papai, o
general Antonio da Silva Campos, não queria o cargo. Em família o pressionamos para que passasse à reserva. Era uma ordem, ele a acatou. (Mantinha o pedido de saída para a reserva pronto na gaveta.) Por conta desta passagem de pouco mais de um ano pelo comando do Ciex, seu nome foi listado entre os 377 responsáveis por crimes contra a humanidade da Comissão da Verdade.
O que leva um nome a ser colocado como responsável por crimes contra a humanidade em um relatório oficial? Ele é citado três vezes no documento, todas de forma vaga. Mas está na lista. Os membros da comissão sequer descobriram o ano em que nasceu ou aquele em que morreu. Puseram seu nome entre os responsáveis pelo pior de todos os crimes que um ser humano pode cometer sem, ao menos, ter o respeito, a decência, de buscar saber de quem se tratava.
A Geisel e Frota, naquele dia, papai argumentou que não tinha o perfil. Que sua vida no Exército havia sido toda baseada no respeito à Convenção de Genebra. “Quem aceita tocar num fio de cabelo de um preso”, lhes disse, “ainda mais torturar, é um ser doente.” Não eram militares de fato. Eram pessoas “a quem nenhuma ordem é capaz de conter”. Como de fato nenhuma ordem conteve. Durante aquele ano do Ciex, que passou viajando de quartel em quartel tentando impedir a barbárie, perdeu dez quilos.
Papai nasceu em família pobre. Sua mãe, imigrante portuguesa, foi uma empregada doméstica que jamais aprendeu a ler. Entrou nas Forças Armadas porque ali poderia estudar, encontrar futuro. Se fez voluntário para combater o fascismo durante a Segunda Guerra. Foi preso e arriscou corte marcial porque se recusava a separar soldados brancos de negros em seu pelotão durante paradas. Contava a história do único homem que soube ter matado, um soldado alemão, na Batalha de Montese. Lance de sorte: sacou mais rápido, disparou. Seguindo as regras, retirou do corpo o cordão de identificação que seria enviado para as forças inimigas e manuseou sua carteira. Lá, encontrou a foto de uma mulher e de um bebê. No meio de um tiroteio, nunca se sabe se uma bala feriu ou matou. Mas, naquele momento, ele soube. Os pesadelos com aquela imagem o perseguiriam pelo resto da vida.
Entre seus melhores amigos estavam vários militares cassados pela ditadura. Dentre eles, o brigadeiro Rui Moreira Lima. Estão, como papai, mortos. Não podem vir à frente e depor em seu nome, contar quem foi Antonio da Silva Campos. Mas eu, sua filha, posso.
O período da ditadura foi difícil para nós. Eu ia às passeatas pedir a volta da democracia, ele implorava que ficasse em casa. Tinha medo de que, se desaparecesse, não conseguiria me localizar. Ainda tenente-coronel, no fim dos anos 1960, foi responsável direto por um preso político, na Vila Militar. Almoçava com ele. Talvez ainda esteja vivo. Foi libertado e retornou para visitar meu pai.
Papai não cometeu crimes contra a humanidade. Tentou evitá-los. Foi escolhido para o cargo para isso. Por seu perfil. Era a missão. Acreditava na instituição do Exército. Talvez não devesse. De fato comandou o Ciex em 1976 e 1977. Mas, por honestidade, por integridade, no mínimo por uma questão de decência, antes de listar seu nome entre alguns dos homens mais abjetos que passaram pelas forças militares brasileiras, deviam se informar sobre quem foi.
Mas não fizeram, sequer, uma busca no Google.
Claudia Maria Madureira de Pinho é filha do general Antonio da Silva Campos, citado pela Comissão da Verdade como responsável por crimes contra a Humanidade
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