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sábado, 29 de novembro de 2014

Fundo do poço

Miriam Leitão

Como foi que se chegou a isso na Petrobras? A maior empresa do país, nascida de um movimento popular, orgulho nacional por ter sido capaz de superar barreiras tecnológicas desafiadoras. Tivemos que ser socorridos por leis internacionais para que a empresa contratasse auditorias, afastasse um executivo sob suspeição, e uma empresa internacional se recusasse a assinar seu balanço.
Com quantos silêncios, vistas grossas e cumplicidades se montou o esquema de roubo dentro da empresa? A corrupção se espalha e contamina como um vazamento de óleo sobre o mar. Mesmo limpas antes do derramamento, as águas acabam sendo impregnadas pela mancha que tira o oxigênio.
Devemos agradecer à lei anticorrupção corporativa americana e ao rigor da SEC, a CVM dos Estados Unidos? Pior é que sim, devemos. Sem as regras deles, o balanço teria sido aprovado e anunciado com a dúvida recaindo sobre o presidente licenciado da Transpetro, Sérgio Machado, citado nominalmente por Paulo Roberto Costa. Ele teria entregue R$ 500 mil ao ex-diretor para que a licitação de compra de um navio fosse dirigida. E quantas embarcações foram compradas durante a longeva gestão do político nomeado por Lula no seu primeiro governo e até hoje no emprego?
A presidente Dilma disse em suas primeiras entrevistas pós-reeleição que não deixaria pedra sobre pedra. Pode começar removendo aquela que encobre o fato de a empresa ter demorado tanto a investigar esse escândalo desde o começo. A presidente, que muito se estarrece com as divulgações, deveria estar estarrecida com os fatos que são divulgados e o ponto fundo a que se chegou. Em lamas ultraprofundas foram feitas tenebrosas transações contra o erário, contra os contribuintes, contra os acionistas minoritários, contra a imagem do país, contra os trabalhadores da empresa, contra a companhia. Com que tristeza os brasileiros constatam o que jorra das camadas mais profundas deste escândalo.
Há perdas materiais em todos os níveis. Dinheiro retirado da empresa em superfaturamento de compras e investimentos que passassem pela Diretoria de Abastecimento. Há perdas para o pequeno investidor que mesmo sem nunca ter estado no mercado acionário comprou ações da Petrobras. Há queda de valor de mercado em qualquer comparação que se faça.
Veja essa realizada pela Mirae Asset para a coluna. Foi pedido aos analistas que comparassem o valor de mercado de empresas com o mesmo tamanho da Petrobras. O que eles responderam foi que a empresa brasileira, com 0,9% das reservas mundiais de petróleo, tem valor de mercado de US$ 74,4 bilhões. A Exxon tem 0,8% e vale US$ 406 bi; a BP Corporation, com 0,9%, é cotada a US$ 129 bi; a PetroChina também tem 0,9% e vale US$ 232 bilhões. A Petrobras perdeu valor por razões internas, pelas fraturas expostas que este caso exibe.
Ao final do dia de ontem, após a retomada da reunião do Conselho de Administração — que havia sido interrompida quando a auditoria PwC avisou que não assinaria o balanço — tudo o que se divulga é que talvez a empresa seja autorizada no fim do mês a aumentar o preço do seu principal produto. Nesta outra frente, a dos preços controlados, a Petrobras perdeu, pelo cálculo dos analistas, US$ 9 bilhões este ano. O governo adia o aumento achando que assim segura uma inflação que já estourou o teto da meta.
Mais importante que um aumento de gasolina ou a divulgação de um balanço trimestral é que seja extirpado esse tumor. E para isso é preciso investigar todo o corpo para saber até onde foi o mal que atingiu a maior empresa do Brasil.

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